sábado, 28 de novembro de 2015

VIII - Memória em Pedra


Vamos apresentar a ermida de Nossa Senhora da Vitoria designada pelos residentes, de S. Jorge, talvez por a imagem do Santo figurar na bandeira de D. Nuno Alvares, condestável de Portugal que comandou a batalha Real.
A visita, comparativa e inclusiva, nas circunstancias do seu tempo a procurar ultrapassar o aspecto físico exterior.
Os locais medievais destinados ao culto, eram considerados de intermediação entre terra e Ceu, conforme a evidencia dos terenos envolventes destinados a sepultura dos defuntos que se acreditava garantirem a viagem celeste aos mais crentes, importantes ou afortunados. Edificados por norma em sítios altos lançados para cima por torres altas, na suposição que Homem ficaria mais protegido quando próximo do Senhor.
Vamos considerar dois templos, próximos, coevos, relativos ao mesmo evento e dedicados a Nossa Senhora da Vitória.
O mosteiro de Nossa Senhora da Vitória, "Casa de Oracon", conhecido por mosteiro da Batalha exemplifica com aparato o "obrigado real" a Virgem Maria, de modo exaltante e alicerce dum reinado pacifico, esclarecido, com preocupacoes dinasticas e nacionais, anunciador de novo tempo com epopeias tidas impossíveis e panteao dos reis de Portugal.
Apresenta no exterior numerosas (380) "gargulas", exteriores, jornadas de figuras monstruosas, humanas ou animalescas, merecedoras de referencia pela função material (salientes desaguadores das caleiras dos telhados a escoar as aguas pluviais que lançam a certa distancia das paredes) e função simbólica (delimitar e proteger o espaco religioso das almas).
Convém relembrar que o templo, a catedral, "cidade celeste, sintese do mundo, onde as criaturas de Deus podiam enirar", era pertença da pureza e do Bern, defendida do maléfico mundo exterior profano).
A grandiosidade do mosteiro, patente na nave real, central, com mais de 90m de comprimento e 30 m de altura. Foi edificado durante 145 anos (1388-1533) nos reinados de D. João I; D. Duarte; D. Afonso V; D. Joao II; D. Manuel I e D. Afonso III). 
E símbolo monumental da nascente dinastia Joanina que expoe no cimo da fachada Sul o escudo real. Experimentou e lancou novas propostas arquitectonicas com linguagem de complexidade estrutural e exuberancia decorativa, usadas depois nos Jerónimos, panteao nacional de D. Manuel I, que tera estado na origem das capelas incompletas.
o porta e principal na fachada Sul do mestre catalao Huguet marca a ascensao para 0 Ceu com anjos, profetas, reis de Israel, apostolos, santos e santas.
A ermida de S. Jorge de simplicidade tocante, terrena, propria do campo onde se deu 0 confronto do exercito invasor de Castela face a hoste minguada mas decidida do rei eleito nas cortes em Coimbra pelo povo de Portugal. E edificacao humilde de 1393,feita a mando do condestavel do reino D. Nuno Alvares Pereira.
o templo foi tendo restauros mas conservou vestígios da planta primitiva como o torreão amuralhado da capela-mor e gargulas, Digno mas despojado como e próprio das coisas guerreiras mede 19 por 13 m, e composto por:
- capela-mor , com abside (parede semicircular ou poligonal por detras do altar), apresenta no fecho da aboboda nas colunas "artesoadas", trabalhadas, 0 pelicano adoptado por D. Joao II, indicio possível de restauro coevo de relação muito forte com Caldas da Rainha, um pouco a Sul.
Por cima do altar-mor esta a imagem de Nossa Senhora da Vitoria, orago, que vela pela utilização da ermida e referida pelo padre Louro no "couceiro ou memorias do bispado de Leiria;
- nave, espaço dedicado aos fieis, apresenta dois altares muito simples.
O do lado do evangelho (esquerda) suporta uma escultura em  pedra que representa S. Jorge "0 Bern" a ferir com lança o dragão infernal "0 Mal", derrubado a seus pes.
O do lado da epistola (direita) tern a estatua do Condestavel a empunhar a sua bandeira a evoca-lo como guerreiro e monge, formas diferentes, complementares, de servir urn ideal elevado.
A ermida apresenta na frontaria uma pedra com inscrição em caracteres góticos maiúsculos a  confirmar ter estada içada no local a bandeira de D. Nuno aquando da batalha Real.
Refere o ano de 143, era hispânica, em vigor em Portugal ate 1422, quando passou para a era de Cristo que por ter menos 38 anos leva a conclusão que a inauguração teria sido em 1393. Redigida conforme indicações de D. Nuno e reza:
ERA: DE MIL:E QUATRO CENT
E TRINTA: E HUU: ANOS:NUNAL
VARES:P(ER)EIRA:CONDE:ESTAB'"
MANDOU; FAZER:ESTA:CAP
EELA: A ONRA: DA V1RG-E: MARIA:POR
QUE: EN 0: DIA: QUE: SE FEZ AQI:A SA
TALHA QUE:ELREY: DE PORTUGAL: OUVE CO:ELREY
DE: CASTELA:ESTEVE. EN ESTELOGAR. A BANDEl
RA: DO: DITO CONDE: ESTABRE:
A pedra apresenta no bordo inferior um corte em V invertido que interrompe a ultima linha da inscrição, talvez por a primitiva porta ter sido ogival com a placa colocada sobre o fecho superior, conforme parece sugerir a marca.
A porta de entrada, na reconstrução da fachada, terá sido mudada para a parede lateral esquerda, onde se encontra.
A fachada apresenta também num nicho a esquerda uma quarta (pequena bilha) cheia de agua para matar a sede a caminhantes, tradicao do sec. xv e compromisso de D. Nuno. a templo tem importancia pelo valor patrimonial, garante da memoria do feito, permite saber o local exacto do confronto e conduta das forcas antagonicas ao considerar o valor defensivo do terreno onde foi erguido, manobras da guerra em uso na epoca e alcance das armas mais letais (besta e arco).
Foi citado em variados documentos por:
.:. Fernão Lopes (cr6nica de D. Joao I);
- Frei Agostinho de Santa Maria (santuário Mariano, 1711) que refere 0 edificado e funções do ermitao ("... ter sempre
agora para os passageiros... j entre outros cuidados:
- Couseiro (impresso em Braga,1868) cita a paga ao ermitao, actividades com dependência religiosa e compromissos dos duques de Bragança.
O templo implantado no campo da batalha Real, evocador da independência de Portugal, tem participado em actos de grande significado nacional que com brevidade iremos referir como os cortejos fúnebres reais de D. Joao I, D. Duarte, D. Afonso V, infante D. Afonso, filho de D. Joao II e D. Joao II.
Julgamos que a participação da ermida de S. Jorge não se terá limitado a acontecimentos relatados por cronistas. Não temos conhecimento de eventos realizados nos cerca de 400 anos seguintes, mas estamos certos que a importancia se manteve por o fundador ser considerado exemplar patriota, guerreiro e santo.
O museu e campo militar de S. Jorge, sob tutela do Exercito, ate finais do séc. xx, comemoraram a efeméride com a digna simplicidade própria das cerimónias militares.

PARA SABER MAIS
ALHO, Ana Patricia Rodrigues, As gargulas do mosteiro de Santa Maria da
Vrt6ria. Funcao eforma. Orafica da Batalha, 2010;

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